quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Um dia

-É melhor um texto que não gosto do que texto nenhum para quem gosta de me ler-


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Sentado, fazia tempo para o cinema aguardando que o amigo voltasse com os cafés. Estava entretido com o telemóvel quando sobre a sua mesa viu deslizar suave a ponta do dedo indicador, um dedo de mulher.

Reconheceu-lhe o anel no polegar, levantou o rosto e viu-a sentar-se à sua frente, do outro lado da mesa.

- Eu vi-te, faz tempo que não passavas ali... Perdeste-me o medo?

- Nunca te tive receio...

- Tretas! deixa-te de merdas, não comigo.

- O que queres tu de mim?

- Bater-te, bater-te com força, fazer-te doer. Quero-te magoar, quero-te magoar muito.

- O que te impede... porquê?

- Porque isto sozinha assim não tem graça, mas sou justa, porquê descarregar em outrem e não a quem de direito? afinal, estás mesmo aqui à minha frente, é só uma questão de não te mexeres muito...

- Força, vá, é o que queres, é o que precisas?

- Não, sinceramente... não, mas ia ajudar um pouco... acho eu.

- Achas? decide, aproveita, estou aqui... tens-me aqui à tua disposição mulher, atira-te de unhas se quiseres

- Dava-te tanto jeito... mas não, não te vou dar esse gozo de teres algo para me odiar, esse sentimento é um exclusivo meu nesta relação...

- É o que tu quiseres - apoiou as mãos na mesa fazendo intenção de se levantar, gesto que ela interrompeu segurando-o colocando suave sobre a dele a sua mão

- Senta, espera...

- Pelo quê?

- Pelo dia em que eu perceba que tu és uma ideia que criei para mim de nós, que és tudo o que sinto... sentiria... olha foda-se, pretérito do condicional ou do imperfeito, uma merda qualquer, não sei... sei o que eu sinto e eu vou sentir por ti, o que tu és aqui dentro de mim e eu não te consigo tirar, não te consigo arrancar... e um dia...

... Vou saber distinguir a tua pessoa da tua recordação.

Hesitou, fitou-a.

Ela sorria.

- E nesse dia, o que acontece?

Sentiu a mão dela fechar, a apertar em redor da sua, viu-a desviar dos seus olhos o olhar

- Adeus, não admito que me vejas a chorar, adeus e da próxima vez... se houver próxima vez...

Levantou-se, contornou a mesa,

- Não fales assim... porquê que...

- Da próxima vez...

Desviou o cabelo para o ombro, baixou-se, aproximando-se do rosto dele o seu.

Tocou-lhe devagar na boca com os lábios, respirou e aprofundou a ideia uns instantes, o suficiente para o saborear.

- Da próxima vez vê se paras o carro e me vais dar um beijo...

Um comentário:

Hathor disse...

eu gosto.... de te ler