domingo, 19 de setembro de 2010

Fugimos os dois

Estou de volta à rua que conheço bem demais.

A cor... o cheiro, a luz e os prédios em seu redor envolvendo.

Sinto a urgência do tempo e começo a subir por entre uma multidão sem rosto, meros figurantes enquanto avanço, primeiro a passo acelerando até me sentir a correr.

Eu sei o que me espera, sei o que ai vem.

Um travo a familiar que me deixa em desconforto.

Por entre os vultos que me seguem...
Sinto um formigueiro a receio, não de medo que aqui tenho coragem e empenho, tenho receio de apenas eu - ou por ser eu - não bastar e ser o suficiente...

Rejo-me no reflexo de uma montra, paro mas a urgência do momento leva-me a recomeçar a correr.

A rua sobe na sua acentuada inclinação e as minhas pernas superam o esforço. Corro, desvio-me de uma, duas, três pessoas e sei que cheguei ao meu destino mas não cheguei ao fim.

Respiro forte e preparo-me para o que sei que vou encontrar.

Olho para a minha esquerda e vejo-a...

Reconheço-lhe o cabelo, o queixo e o pescoço.

Reconheço-lhe um olhar que ainda não me viu.

Ainda não lhe entrei em cena...

Vejo-lhe aquele cabelo negro e... para meu espanto...

Encontro-lhe um peso no rosto... o peso do passar de muitos anos que sei que ela ainda não os tem.

É o tempo, o momento de decidir e avançar...

E eu avanço.

Envolvo-lhe a cintura com o meu braço direito e puxo-a para mim.

- Temos que ir

Digo-lhe em alerta, tenso.

Ela sorri e aceita no nervoso do momento .

Sem hesitar partimos... alguém nos segue... alguém que não está só...

Eu fixo o olhar na sua mão vazia que me pede para a segurar para me seguir...

E fugirmos os dois...



Vejo o chão, vejo a rua, vejo os prédios que a envolvem na sua inclinação sempre tão cansativa a subir.

Revejo-me no meu reflexo e sinto que por entre a multidão alguém me segue...

Não hesito a passo e corro veloz...

Desvio-me de Um, dois, três figurantes e sinto que cheguei.

Olho e vejo-a...

Corro na sua direcção, sentada no banco do outro lado da rua, no outro passeio.

Levanto-lhe o rosto com a mão e ela sorri.

Não lhe encontro as rugas no rosto, não lhe encontro surpresa ou travo a hesitação.

Ela levanta-se e puxa-me para si pela mão.

Beija-me no rosto tranquila e a saber a amante sem tempo para desenvolver o momento.

Alguém nos segue entre a multidão e nós...

E nós fugimos os dois...



Acordo.
Sento-me na cama e suspiro pesado.
Não sei o que pensar deste sonho recorrente.

Nota- sei quem ela é, sei que rua subo a correr e sei que me irrita andar a sonhar a mesma coisa consecutivamente.
Não sei quem me segue nem o que concluir dos sonhos que escrevi.

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